Dr. Herculano Diniz

A doença renal crônica (DRC) é uma condição que afeta os rins, prejudicando sua capacidade de filtrar o sangue e remover resíduos do corpo. Neste texto abordaremos suas causas mais comuns, medidas preventivas para evitar sua progressão e suas opções de tratamento.

O que é doença renal crônica ?

Considera-se como função renal normal, uma taxa de filtração glomerular acima de 90 ml/min (algo semelhante à porcentagem de função renal que a pessoa possui – por exemplo 90%).

Doença renal crônica é a perda irreversível e persistente por mais de três meses da função renal. 

Além disso, pacientes com mais de 90% da função renal mas com alterações no exames de urina (perdas anormais de proteínas, eletrólitos – por exemplo potássio, bicarbonato) ou alguma alteração na forma dos rins e das vias urinárias também são portadores de doença renal crônica. 

Quais são as causas mais comuns de doença renal crônica?

1) – Pressão alta (Hipertensão arterial sistêmica) : 

Pressão alta é quando os níveis de pressão sanguínea encontram-se 

persistentemente maiores que 140 por 90 mmHg (14 por 9 referido pela população em geral).

A pressão ideal seria menor que 120 por 80 mmHg, e os pacientes com pressões entre 120 por 80 e 140 por 90 deveriam verificar sua pressão ao menos 1 vez a cada seis meses. 

Vale lembrar que a pessoa pode ter pressão alta e não sentir absolutamente nada. 

A pressão alta ou hipertensão arterial pode ser completamente assintomática e causar malefícios a diversos órgãos – insuficiência cardíaca, infarto, AVC, doença renal crônica.

2) – Diabetes: 

É o aumento dos níveis de glicose no sangue. 

O diabetes pode ser causado  pela falta da insulina –  hormônio que permite a entrada de glicose nas células – que é o diabetes mais comum em pessoas jovens ou uma redução na resposta do organismo à insulina, tipo de diabetes mais comum em pacientes mais velhos, mais comuns obesos.

O tipo de diabetes que se desenvolve mais tardiamente, pode não apresentar qualquer tipo de sintoma, assim como a pressão alta.

O diabetes é uma doença silenciosa, podendo causar várias doenças em diversas partes do corpo (por exemplo infarto, AVC e doença renal crônica)

3) – Infecções urinárias de repetição:

Infecção urinária é a subida de bactérias – principalmente bactérias presentes nas fezes – através da via de saída da urina – uretra – podendo chegar na bexiga e até mesmo nos rins.

Infecções de urina repetidas (mais de 2 em 6 meses ou 3 em 1 ano) são fatores de risco para lesões nos rins e aparecimento de doença renal crônica.

A esquerda – espalhando amostra de urina em uma placa para verificar o crescimento de bactérias. A direita – crescimento de bactérias em placa após espalhada amostra de urina. 

4) – Nefrites ou glomerulonefrites:

Nefrite ou glomerulonefrite é a inflamação do filtro do rim – chamado glomérulo – fig. 3 e 4 – e caso não identificada rapidamente pode levar a uma lesão irreversível dos rins, nos casos mais graves.

anatomia do rim demonstrando o glomérulo – o filtro do rim

Habitualmente, paciente com nefrites podem apresentar nas suas formas menos até as mais sintomáticas:

  1. retenção de líquido / inchaço

A esquerda edema de face causado por glomerulonefrite, a direita foto do mesmo paciente sem edema.

marca da pressão de dedo na perna de um paciente com edema de perna

  1. redução da quantidade de urina – oligúria. 
  2. aumento da pressão arterial
  3. presença de urina escura contendo sangue ou perda de outras substâncias na urina – por exemplo proteínas – vale lembrar que a perda de sangue na urina pode não ser visível ao olho nú, sendo necessário exame de urina para identificação do sangue

Da direita para esquerda: dois primeiros frascos – coloração normal de urina / do terceiro ao quinto frasco da urina com quantidades maiores de sangue.


análise da urina em microscópio, pode revelar presença de sangue não visível a olho nú

  1. – perda de função renal.

5) – Doença renal policística

A doença renal policística é um tipo de doença que costuma passar de pais para 

filhos, causando a substituição do tecido renal saudável por cistos (como se bolhas tais como bexigas d’água) e perda progressiva da função renal. 

Em tais casos não há tratamento específico, mas adoção de medidas para reduzir a velocidade da perda de função renal. 

à esquerda imagem de um rim de aspecto normal e a esquerda com seu tecido substituído por cisto

Para saber mais sobre cistos renais :

https://drherculanonefrologista.com.br/cistos-renais/

Medidas para evitar a progressão da doença renal crônica : 

Uso de Medicações da família dos Anti-inflamatórios Não Esteroides (AINEs) : 

Os anti-inflamatórios não esteroides (sigla AINEs), são uma família de medicamentos utilizados para tratamento de dores agudas e podem ser adquiridos sem receita médica. 

uso de medicações sem prescrição médica pode causar efeitos colaterais como sangramento no estômago e piora irreversível da função dos rins

Embora eficazes no alívio da dor e da inflamação, seu uso pode causar piora da função renal, assim como sangramento no estômago. É importante sempre utilizar medicações com orientação médica, especialmente se você já tem DRC ou fatores de risco para desenvolvê-la. Existem alternativas seguras para controle da dor se você é portador de doença renal crônica. 

Uso de contraste iodado intravenoso (injetado nas veias) para exames complementares, como tomografias e cateterismo

uso de contraste injetado nas veias realça a imagem e auxilia no diagnóstico, mas pode causar piora da função renal. 

Exames de imagem que utilizam contraste iodado injetável, como tomografias e cateterismos, podem ser necessários para alguns diagnósticos. No entanto, esses contrastes podem ser prejudiciais aos rins, especialmente se você já tem doença renal crônica (DRC). 

Para evitar danos, é importante comunicar ao seu médico sobre sua condição renal antes de realizar qualquer exame que envolva o uso de contraste. Os profissionais de saúde podem ajustar as doses ou considerar alternativas mais seguras para realizar o diagnóstico. 

Uso de Contraste para Ressonância Magnética

Os contrastes usados em ressonâncias magnéticas geralmente contêm um elemento químico chamado Gadolínio. Alguns pacientes com DRC apresentam risco de desenvolver uma condição rara, mas grave, chamada fibrose sistêmica nefrogênica (FSN) após a exposição ao gadolínio. Para minimizar esse risco, é importante evitar o uso de gadolínio de primeira geração, se possível. Novas formulações mais seguras estão disponíveis e podem ser uma opção mais adequada para pacientes com DRC.

Consumo de Fruta Carambola

Pacientes com doença renal crônica não devem consumir carambola ou seus derivados (sucos, doces) pois pode causar perda irreversível da função renal e complicações graves como crises convulsivas, coma e até mesmo a morte. 

A carambola, uma fruta tropical deliciosa, contém uma substância tóxica chamada caramboxina, que pode ser prejudicial aos rins. Em pessoas com DRC, a ingestão de carambola pode levar a complicações graves, como convulsões e até a morte. Portanto, é fundamental que pacientes com DRC evitem o consumo de carambola ou qualquer produto que a contenha. Se você tem DRC, esteja atento a sua dieta e consulte um nutricionista para orientações específicas.

Para saber mais sobre como se prevenir da doença renal crônica:

https://www.sbn.org.br/utilidades-para-o-paciente/como-se-prevenir/

Tratamentos para doença renal crônica

Tratamento conservador

Como o próprio nome diz, são as medidas para conservar a função do rim, evitando que atinja as fases finais da doença renal, quando será necessário substituir a função dos rins nativos.

Tais medidas incluem:

  1. Controle da Pressão Arterial: Manter a pressão arterial sob controle é fundamental para proteger os rins. Isso inclui uma dieta com baixo teor de sódio, medicação prescrita pelo médico e mudanças no estilo de vida.

controle da pressão arterial e glicose sanguínea evitam a progressão da doença renal 

  1. Controle da Glicose: Se você tem diabetes, controlar rigorosamente seus níveis de glicose no sangue é essencial para evitar danos renais.
  2. Dieta Saudável: Uma alimentação equilibrada, com ênfase em frutas, vegetais, grãos integrais e proteínas magras, pode ajudar a manter a saúde renal, evitar excesso de potássio e fósforo. Uma dieta equilibrada, com baixo teor de sal, é benéfica para a saúde renal. Reduza o consumo de alimentos processados e ricos em sódio (o sódio está presente no sal que é o cloreto de sódio).

Ingerir alimentos naturais, evitar açúcares, sal, alimentos processados e ricos em gordura e contribuem para uma melhor qualidade de vida e preservam a saúde dos rins

  1. Exercício Físico: Manter um peso saudável e se exercitar regularmente pode melhorar a saúde cardiovascular, reduzir a pressão arterial e ajudar a manter os rins em bom funcionamento.

A prática de atividade física regular ajuda a manter o peso, aumentam a disposição física e auxiliam no combate ao estresse. 

  1. Evitar o Tabagismo e o Álcool: O tabagismo e o consumo excessivo de álcool podem agravar a DRC. Parar de fumar e consumir álcool com moderação são medidas importantes.
O tabagismo aumenta o risco de morte por diversas doenças, além de piorar a doença renal crônica
  1. Evitar o uso de medicamentos tóxicos ao rins – nefrotóxicos: Alguns medicamentos podem causar danos aos rins. Certifique-se de usar medicamentos apenas sob supervisão médica e informe seu médico sobre todos os medicamentos que você toma.
  2. Acompanhamento Médico: Realize consultas médicas regulares e exames de sangue para monitorar a função renal. O diagnóstico precoce de qualquer problema renal é fundamental.

É importante consultar o médico com frequência para diagnóstico de doenças assintomáticas e orientações sobre um estilo de vida saudável além da escolha de medicações para evitar danos a saúde. 

  1. Hidratação Adequada: Beber água suficiente ajuda a manter os rins saudáveis, evitando a formação de cálculos renais.
  2. Gerencie o Estresse: O estresse crônico pode afetar negativamente a saúde geral, incluindo a renal. Práticas de gerenciamento do estresse, como meditação ou ioga, podem ser úteis.

https://www.sbn.org.br/orientacoes-e-tratamentos/tratamentos/tratamento-conservador/

Hemodiálise

A hemodiálise é um dos tratamentos mais comuns para pessoas com DRC em estágio avançado. Ela envolve o uso de uma máquina com um filtro, removendo substâncias tóxicas e excesso de líquido, que os rins danificados não conseguem mais fazer.

Para realizar uma sessão de hemodiálise, o paciente precisa de um “caminho” para o sangue sair do corpo, ser filtrado pela máquina e devolvido para o paciente.  

Esse caminho – chamado acesso vascular –  pode ser criado com uma pequena cirurgia, normalmente no braço ou através de uma cateter – um pequeno cano inserido em uma veia com um formato da letra “Y”, com o sangue sendo retirado por uma das vias desse cano, filtrado na máquina e devolvido pela outra via do cano. 

Um cateter – um pequeno cano – colocado em uma veia do paciente com o formato da letra “Y” permite que o sangue saia do paciente em direção a máquina para ser filtrado e devolvido limpo para o paciente.

Uma fístula construída através de uma pequena cirurgia é furada com duas agulhas, uma para levar o sangue para máquina de hemodiálise e outra para devolver o sangue limpo para o paciente

O sangue flui da pessoa para a máquina de diálise, onde é limpo e depois retorna ao corpo. As sessões de hemodiálise geralmente duram algumas horas e são realizadas regularmente, geralmente três ou mais vezes por semana.

Este tratamento é eficaz para manter o corpo livre de substâncias tóxicas e o paciente precisa ir até o centro de hemodiálise onde é submetido ao tratamento e depois liberado para suas atividades do dia a dia.

Hemodiálise é a limpeza do sangue e retirada de líquidos através de uma máquina com um filtro pelo qual o sangue do paciente circula fora do seu corpo. Na figura acima o sangue sai do paciente, é filtrado na máquina e devolvido limpo ao paciente.

Para saber mais sobre hemodiálise e como funciona :

https://drherculanonefrologista.com.br/como-funciona-a-dialise/

https://www.sbn.org.br/orientacoes-e-tratamentos/tratamentos/hemodialise/

Diálise Peritoneal

A diálise peritoneal é outra opção de tratamento para a DRC que utiliza o revestimento da cavidade abdominal, chamado peritônio, como um filtro. 

Neste processo, um cateter é inserido na cavidade abdominal, através do qual é colocado um líquido na cavidade abdominal por um período de tempo específico, durante o qual ela absorve resíduos e toxinas do corpo através dessa membrana que cobre os intestinos – o peritônio. Em seguida, a solução é drenada, levando consigo os resíduos e toxinas.

Um cateter de diálise peritoneal 

Diálise peritoneal – é colocado líquido dentro da barriga do paciente através de um pequeno cano chamado cateter – colocado através de uma pequena cirurgia – e a membrana que cobre os intestinos – chamada peritônio –  deixa sair o excesso de líquido e impurezas e depois esse líquido “sujo” é retirado. O processo é repetido  várias vezes para garantir uma limpeza adequada das impurezas do sangue.

A diálise peritoneal pode ser realizada em casa, oferecendo uma certa flexibilidade em comparação com a hemodiálise, que normalmente é realizada em um centro de tratamento. Isso permite que os pacientes continuem suas atividades diárias de forma mais independente. No entanto, requer uma programação rigorosa e um cuidado constante para evitar infecções.

O centro de diálise é o local para onde o paciente é encaminhado para se preparar e ser treinado para a realização do processo em casa. O paciente recebe uma máquina para o tratamento em casa, assim como as bolsas com a solução para serem colocadas na barriga. 

Essas trocas acontecem de forma automática, habitualmente durante o sono, com a máquina colocando e retirando o líquido na barriga do paciente diversas vezes durante o tratamento. 

Um paciente dormindo, ligado a máquina de diálise peritoneal (chamada cicladora) que de maneira automática coloca o líquido limpo e retira o líquido sujo várias vezes enquanto o paciente dorme.

Imagem de uma máquina – cicladora – de diálise peritoneal

Para saber mais :
https://drherculanonefrologista.com.br/dialise-peritoneal/

https://www.sbn.org.br/orientacoes-e-tratamentos/tratamentos/dialise-peritoneal/

Transplante Renal

O transplante renal é a terceira opção de tratamento para a DRC e é considerado o método mais eficaz, pois substitui completamente a função dos rins doentes. Neste procedimento, um rim saudável de um doador compatível, seja um doador vivo ou de um doador falecido, é transplantado para o paciente com DRC.

O transplante renal consiste no implante de um rim de um doador vivo ou falecido em um paciente com os rins não funcionantes

Os transplantes renais de doadores vivos são preferíveis porque o órgão transplantado geralmente funciona melhor e dura mais tempo. No entanto, a obtenção de um doador compatível pode ser um desafio. Os transplantes de doadores falecidos são mais comuns e geralmente envolvem a correspondência do paciente com um rim de um doador que faleceu recentemente.

Um transplante renal bem-sucedido pode oferecer ao paciente uma vida praticamente normal, sem a necessidade de diálise regular. No entanto, é importante lembrar que o transplante renal não é uma cura definitiva para a DRC, e os pacientes transplantados ainda precisam de acompanhamento médico e medicação para evitar a rejeição do órgão.

Doação de Doador Falecido

Quando alguém falece e decide doar seus órgãos, como os rins, eles passam por uma série de testes para verificar a compatibilidade com os receptores. Se os rins são compatíveis, eles são removidos do doador falecido e transplantados no receptor.

Doação de Doador Vivo

Em alguns casos, um membro da família ou amigo próximo do receptor pode doar um rim. Isso é chamado de “doação de vivo”. Antes disso, tanto o doador quanto o receptor são avaliados para garantir que o doador possa viver saudavelmente com um rim apenas.

Doação de Não Relacionados ou não aparentado

Às vezes, pessoas sem laços familiares próximos desejam doar um rim. Isso é permitido em muitos lugares, mas o doador e o receptor passam por uma extensa avaliação para garantir que seja seguro e voluntário.

Aspectos Legais

Há leis rigorosas em vigor para garantir a segurança e a ética do processo de transplante. Isso inclui regulamentações para doadores vivos e a proibição do comércio de órgãos.

Após a cirurgia, o receptor recebe o novo rim, e a recuperação começa. O transplante renal é um procedimento incrível que oferece uma segunda chance de vida para muitas pessoas.

https://www.sbn.org.br/orientacoes-e-tratamentos/tratamentos/transplante-renal/

Considerações finais sobre tratamentos para doença renal crônica

A escolha entre hemodiálise, diálise peritoneal e transplante renal depende de vários fatores, incluindo a gravidade da DRC, a saúde geral do paciente, a disponibilidade de doadores e as preferências pessoais. Cada um desses tratamentos tem suas vantagens e desvantagens.

A hemodiálise é eficaz na remoção de resíduos do sangue, mas requer visitas frequentes ao centro de tratamento. A diálise peritoneal oferece mais flexibilidade, mas exige um compromisso rigoroso. O transplante renal é a opção mais eficaz e, quando bem-sucedido, oferece a melhor qualidade de vida.

É importante que os pacientes com DRC discutam suas opções com uma equipe médica especializada e tomem uma decisão informada com base em suas necessidades e circunstâncias individuais. A gestão da DRC pode ser desafiadora, mas com o tratamento adequado, muitos pacientes conseguem levar uma vida satisfatória e saudável.

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